segunda-feira,
26 fevereiro, 2018 - 8h42 | ÁGUA
Chuva
para evitar nova crise hídrica
Em
março, enquanto especialistas e chefes de Estado estarão
debatendo a gestão sustentável dos recursos hídricos
no planeta, no 8º Fórum Mundial da Água, em
Brasília, a capital paulista completa exatos dois anos
do anúncio do fim da crise hídrica no estado
Agência
Brasil
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Chuva
para evitar nova crise hídrica - A barragem Sete Quedas
faz parte do Sistema Guarapiranga que atualmente está
com índice de armazenamento em 75,3% | Rovena Rosa/Agência
Brasil |
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À
época, em 2016, a informação era de que a
Grande São Paulo não enfrentava mais problemas de
falta de água e que os reservatórios que abasteciam
a cidade estavam em níveis seguros.
Especialistas
concordam que a situação atual é melhor,
mas alertam que os riscos do desabastecimento não estão
totalmente afastados. Hoje, em pleno verão, o reservatório
da Cantareira, o principal da metrópole, apresenta os mesmos
níveis da fase anterior ao início da crise, quatro
anos atrás.
Em entrevista
à TV Brasil, o secretário de Saneamento e Recursos
Hídricos de São Paulo e presidente do Conselho Mundial
da Água, Benedito Braga, afirmou que a situação
atual é mais tranquila e que obras e a conscientização
da população ajudaram nessa melhora.
“Estamos
numa situação relativamente tranquila do ponto de
vista dos recursos hídricos. Passamos em 2014 e 2015 uma
situação muito complexa, mas as obras que executamos
e as medidas que foram tomadas no controle do uso das águas
pelas pessoas tiveram uma colaboração importante”,
ressaltou.
Embora
considere a situação normal, o secretário
espera pelas chuvas: “Estamos aguardando as chuvas do verão
para que a gente possa encher os reservatórios e ficar
mais sossegados ainda no início do ano que vem”.
O engenheiro
especializado em gestão de recursos hídricos e professor
da Universidade Mackenzie, Paulo Ferreira, concorda que a situação
está mais tranquila, mas, segundo ele, não há
água de sobra no estado.
“Hoje
estamos no limite, o que produz gasta, e nós não
temos reserva. Dizer que estamos fora da crise hídrica
é um pouco temerário. Se ficarmos com um período
hidrológico de um ano irregular, acho que voltamos para
a crise. A Sabesp [Companhia de Saneamento Básico do Estado
de São Paulo] tem gestão eficiente para trabalhar,
tem recursos, capacidade técnica para enfrentar, então
vai ser minimizado esse problema, mas não vai deixar de
existir, estamos no fio da navalha em termos de consumo e produção”.
Ferreira também já atuou como diretor da Sabesp
e da Companhia Ambiental do Estado de São Paulo (Cetesb).
Obras
hídricas
A interligação
Jaguari-Atibainha é uma das principais obras em execução
para ampliar os níveis de segurança hídrica
da região metropolitana de São Paulo, e liga as
represas Jaguari, na Bacia do Paraíba do Sul, e Atibainha,
uma das que compõem o Sistema Cantareira.
Segundo
a Sabesp, quando estiver concluída, a interligação
permitirá transferências de água a uma vazão
média de 5.130 litros por segundo (l/s) e máxima
de 8,5 mil l/s da represa Jaguari para a Atibainha, e de 12,2
mil l/s no sentido contrário, garantindo assim o abastecimento
de toda a população atendida pelos dois sistemas.
“Hoje,
o Sistema Cantareira abastece cerca de 9,5 milhões de pessoas
e o Paraíba do Sul, 3 milhões. Ao conectarem-se
ao sistema integrado que abastece a Grande São Paulo, mais
de 20 milhões de pessoas serão beneficiadas. As
obras foram 96,5% concluídas”, disse em nota. A companhia
não informou a data de inauguração.
Os índices
dos sistemas de abastecimento de água da Grande São
Paulo são divulgados diariamente pela Sabesp. De acordo
com última atualização, o índice global
de armazenamento de água marcava 58,9%. Já no Sistema
Cantareira o índice era de 51,9% armazenado. O Cantareira
é o maior e o mais importante reservatório do Estado
de São Paulo e abastece cerca de 9,5 milhões de
pessoas na Grande São Paulo.
De acordo
com a Sabesp, a obra é fundamental para o abastecimento
da capital. “A interligação Jaguari-Atibainha
é uma obra prioritária da Sabesp para garantir o
abastecimento à população, ao lado do novo
Sistema Produtor São Lourenço e da captação
no rio Itapanhaú.” O investimento de R$ 555 milhões
é financiado pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico
e Social (BNDES).
Na opinião
do professor Paulo Ferreira, a interligação Jaguari-Atibainha
vai apenas amenizar o Sistema Cantareira: “É uma
obra que melhora a eficiência, a flexibilidade do Sistema
Cantareira, não vai ajudar em nada no Paraíba, é
uma válvula de escape do Cantareira se tiver esse problema
[falta de água]”. O engenheiro explicou que o Jaguari
é uma vertente do Rio Paraíba. “Essa água
pertenceria à bacia do Paraíba, do outro lado você
tem a bacia do Cantareira. No desespero da crise hídrica,
o Paraíba tinha mais água”, disse.
Composto
por seis represas, que juntas têm uma capacidade de armazenamento
de quase 1 trilhão de litros de água, o Cantareira
é, segundo a Sabesp, o maior sistema produtor da região
metropolitana de São Paulo. As represas Jaguari, Jacareí,
Cachoeira e Atibainha estão localizadas na Bacia Hidrográfica
dos rios Piracicaba, Capivari e Jundiaí (PCJ), enquanto
que as represas Paiva Castro e Águas Claras localizam-se
na Bacia Hidrográfica do Alto Tietê.
As represas
são interligadas por cerca de 28 quilômetros de túneis
e canais e contam com uma estação elevatória
com capacidade para impulsionar 33 mil litros por segundo de água
em um desnível geográfico de cerca de 120 metros.
O tratamento é feito na estação do Guajaú,
a maior instalação de tratamento da Grande São
Paulo.
Já
o Sistema Produtor São Lourenço é uma Parceria
Público-Privada (PPP) entre a Sabesp e um consórcio
de empresas para instalar um novo sistema produtor de água
para a Região Metropolitana de São Paulo. Ele vai
bombear até 6,4 mil litros de água por segundo da
represa Cachoeira do França, em Ibiúna (SP), até
a Estação de Tratamento de Água (ETA) em
Vargem Grande Paulista.
“Essa
água abastecerá cerca de 2 milhões de pessoas
em Barueri, Carapicuíba, Cotia, Itapevi, Jandira, Santana
de Parnaíba e Vargem Grande Paulista. A obra, um investimento
de R$ 2,21 bilhões, gerou cerca de 4,5 mil empregos diretos
e indiretos durante sua execução. Os testes de pré-operação
do Sistema Produtor São Lourenço já se iniciaram”,
informa a Sabesp.
Outra
obra para ampliar a oferta de água para a capital e a Grande
São Paulo foi autorizada pelo governo estadual: as obras
de reversão das águas do Rio Itapanhaú para
o Sistema Produtor Alto Tietê permitirão bombear
em média 2 mil litros de água por segundo na média
anual, respeitando a outorga definida e a disponibilidade hídrica
da bacia. Essa vazão equivale ao consumo de 600 mil pessoas.
Com investimento
de R$ 91,7 milhões, será feita uma estrutura de
bombeamento no ribeirão Sertãozinho, um formador
do Rio Itapanhaú. A água captada do ribeirão
será transferida por tubulação até
o reservatório Biritiba-Mirim, que faz parte do Sistema
Alto Tietê. “Dessa forma, a Sabesp terá mais
água à disposição para tratar e distribuir
às casas, comércios e indústrias”,
informou em nota o governo estadual. A obra deve gerar 1.070 empregos
diretos e indiretos.
O bombeamento
das águas do Itapanhaú beneficiará diretamente
cerca de 4,5 milhões de moradores que são abastecidos
pelo Sistema Alto Tietê e, indiretamente, cerca de 21 milhões
de pessoas que moram e trabalham na capital e Grande São
Paulo, já que a Sabesp possui um sistema interligado e
que pode realizar manobras operacionais no aproveitamento dessa
água nova.
O modelo
de captação escolhido pela Sabesp para esta obra
é semelhante ao utilizado em Nova York (The Catskill Aqueduct).
Há pelo menos 150 anos, a água que abastece os nova-iorquinos
vem das montanhas que ficam a cerca de 160 quilômetros da
cidade. A água tem qualidade superior, já que os
rios praticamente não sofrem impacto da ação
humana. “O mesmo acontece com a água que será
captada do rio Itapanhaú”, afirma a nota.
Chuvas
As chuvas
mais volumosas ao longo do verão passado e os registros
de 2017 contribuíram para a recuperação dos
sistemas que abastecem a Grande São Paulo. Os níveis
apresentados atualmente, a um mês para o fim do verão,
pelos seis mananciais administrados pela Sabesp são os
seguintes: Cantareira com 51,9%, Alto Tietê, 59,3%; Guarapiranga,
75,3%; Alto Cotia, 90,3%; Rio Grande, 83,3% e Rio Claro, 102%.
As chuvas
de janeiro ficaram 29,5% abaixo da média esperada para
o mês na capital, de acordo com os pluviômetros do
Centro de Gerenciamento de Emergências Climáticas
da Prefeitura de São Paulo (CGE). A cidade registrou 184,4
milímetros (mm) de chuva em média este mês,
sendo que o esperado é 261,7 mm.
A média
histórica é calculada a partir da base de dados
do CGE, que compila as informações desde 1995. “Apesar
da ocorrência de intensos temporais em algumas tardes, as
chuvas continuaram ocorrendo de forma irregular ao longo do período,
o que contribui para o menor acumulado em média”,
explica o meteorologista do CGE, Michael Pantera. Assim, este
é o quarto mês de janeiro mais seco da série
histórica do CGE. Vale observar que o janeiro de 2017 foi
o terceiro mais chuvoso desde 1995, acumulando 375,7mm.
De acordo
com o CGE, para este mês de fevereiro, a expectativa é
de chuvas dentro ou ligeiramente abaixo da média, que devem
ocorrer de forma irregular. Os meteorologistas do órgão
ressaltam que temporais durante as tardes são comuns durante
o verão e devem continuar até o fim de fevereiro
que é, historicamente, o segundo mês mais chuvoso
para a capital paulista. “O fenômeno La Niña
segue em curso no Pacífico Equatorial, mantendo a irregularidade
das chuvas, principalmente sobre o Sudeste e Centro-Oeste do Brasil”,
completa Pantera.
No entanto,
para o nível do Cantareira aumentar é necessário
que chova nas regiões sul de Minas Gerais e norte de São
Paulo, especificamente em quatro cidades: Extrema, Itapeva e Camanducaia,
no distrito Monte Verde, em Minas Gerais, e Joanópolis,
em São Paulo, municípios que abastecem os reservatórios
do sistema.
Para o
aumento do nível dos mananciais, a qualidade da chuva também
é fundamental. Ela deve ser abrangente, duradoura, frequente
e homogênea. De acordo com os pesquisadores do Centro de
Previsão de Tempo e Estudos Climáticos do Instituto
Nacional de Pesquisas Espaciais (Cptec/Inpe), a previsão
climática para o trimestre dezembro, janeiro e fevereiro
foi de 33%/33%/33% para o estado de São Paulo e sul de
Minas Gerais.
“Isso
significa que não há confiabilidade em estimar se
a precipitação ocorrerá acima, abaixo ou
dentro da normal climatológica. Esta condição
reforça a necessidade de se destacar a variabilidade que
é esperada para os próximos meses”, informa
nota do instituto. Segundo o Cptec, o verão no Sudeste
é caracterizado por precipitações intensas,
mas também por alta variabilidade. “É comum
ocorrerem alternâncias entre períodos de chuva e
de tempo seco que acabam, algumas vezes, resultando em erros nas
estimativas”.