O conceito Uber como modelo de cidade

Quando Travis Kalanick e Garrett Camp tiveram um problema para conseguir um táxi, talvez nem imaginassem que o Uber, aplicativo criado por eles exatamente para resolver a questão, fosse se transformar num conceito

Bateram de frente com um mercado rigidamente estabelecido, os táxis, em especial nos países pouco familiarizados com o hábito do empreendedorismo ou com regulação estatal sobre o serviço ou com a síndrome da miopia.

Enfrentam muitas batalhas ainda, mas o serviço veio para ficar e é tão revolucionário que já aponta na direção dos carros sem motorista.

Um tanto antropófago, mas definitivamente lógico pela própria natureza da iniciativa e as bases em que se construiu. Nesse sentido, mesmo que taxistas tradicionais aceitem aderir ao serviço, os dias da profissão estão contados.

O tempo que estamos vivendo, dá todas as indicações de que a história vai migrar rapidamente em outras áreas da vida como conhecemos hoje.

Poderia chamar de conceito Google, cuja missão é organizar as informações do mundo e torná-las mundialmente acessíveis e úteis. Ou seja, o próprio mundo. Uma grande sacada de Sergey Brin e Larry Page que em pouco mais de uma década, mudou o jeito do planeta funcionar.

No espírito, Uber tem sensibilidade de Google e está focado em um nicho, mesmo tendo desenvolvido soluções digitais em diversas áreas, como por exemplo o próprio gmail entrar. Tenho certeza que vai longe.

O conceito aplicado às cidades

A cidade em que moro, Uberlândia, tem um pouco disso no seu DNA. Remonta ao início do município, um tanto fora da rota do progresso da época, pela teimosia e espírito visionário dos seus pioneiros. Longa história que não dá para contar aqui.

Pois vejamos, temos nosso próprio sistema de tratamento de água e esgoto, nossa própria fábrica de chocolates, nossa própria fábrica de sorvete, nosso próprio sistema de saúde, nossa própria empresa de telefonia e já tivemos nossa própria geradora de energia. Fabricamos nossos produtos de limpeza e alimentícios. Temos um berço natural de artistas de todas as vertentes e por esses e outros atributos, muitas vezes dá a impressão de ser uma cidade-estado. O ritmo aqui é bem diferente.

Está aqui uma das mais bem estruturadas empresas de energia fotovoltaica e a cidade já ocupa um lugar respeitável em tamanho de parque instalado dessa matriz energética.

A cidade enfim tem uma série de atividades padrão “Uber” e só passa aperto mesmo, quando depende de serviços que são atribuições do Estado de Minas Gerais, ou da União. Quando o assunto é resolvível por aqui, flui.

Não é o “eldorado” apregoado em outros tempos, mas é uma cidade que se resolve. Tem problemas, muitos, mas tem um bom DNA e caminha na frente da média.

A tecnologia com suas maravilhas e facilidades, vai permitir muito em breve que caminhemos para uma margem bem elevada de autossuficiência.

Uma cidade padrão Uber é no meu entendimento, aquela que se organiza para resolver localmente todas as questões necessárias, sem esperar que alguém distante, decida quando é a hora de colocar atenção nos problemas.

As cidades foram pensadas há muito tempo, num padrão completamente analógico e cartesiano, de maneira que digitalizar essas cidades, implica em começar do zero, coisa que pouquíssimas conseguirão fazer em poucas décadas. Fios, canos, postes, calçadas, árvores, ruas e posição das casas nos lotes, ainda obedecem a um padrão caótico que teve a visão meramente econômica como diretriz.

Aliás, voltando para Uberlândia, temos em andamento um conceito de cidade autossustentável, na região Leste. Construída sob essa ótica. A partir do zero.

Por outro lado temos dois problemas na minha visão:

– Condomínios fechados e seus longos muros e conjuntos habitacionais populares que nascem sem muros e em pouco tempo são puro muro. O primeiro isola pessoas da cidade o segundo isola as pessoas de si mesmas.
Nenhum dos dois combina com a cidade orgânica e integrada que muitos e eu me incluo, defendem.

Pensar “Google” e “Uber” significa detonar todos os conceitos de vida como conhecemos hoje. Não precisamos mais de grandes prédios, grandes estruturas, extensos sistemas de transporte, organizações centralizadas e isso inclui, shoppings, escolas, bancos, conjuntos habitacionais nas distantes periferias e num passo além, polícia e bombeiros nos moldes como são hoje, substituídos por sistemas de vigilância e de combate a incêndios, dando tempo para que cheguem ao local da ocorrência sem que os danos aumentem. E vai chegar às estruturas de comando, de governo.

Precisamos muito trazer essa discussão para o topo das preocupações dos cidadãos. As cidades precisam rapidamente se tornar sustentáveis e autossuficientes. É futuro mais do que presente. Não dá para perder mais tempo.