sábado,
24 fevereiro, 2018 - 15h07 | ÁGUA
Recuperar
mananciais e soluções de moradia nas cidades
Com
os crescentes riscos à segurança hídrica
das metrópoles brasileiras, a preservação
e recuperação dos mananciais se torna um tema cada
vez mais importante
Agência
Brasil
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Recuperar
mananciais e soluções de moradia nas cidades
- Moradias construídas às margens da Represa
Billings, um dos principais reservatórios de água
de São Paulo | Rovena Rosa/Agência Brasil |
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A discussão
envolve outras questões de difícil solução,
como a falta de moradias nos centros urbanos. “Não
há solução que não passe pelo problema
na habitação. Quando a gente fala disso, não
é possível se resolver uma coisa sem resolver a
outra. Há um déficit gigantesco de moradia, nas
áreas metropolitanas principalmente. As pessoas acabam
indo morar onde conseguem”, enfatiza o presidente do Instituto
Trata Brasil, Édison Carlos.
A preservação
e a recuperação dos mananciais estão entre
os pontos da agenda do 8º Fórum Mundial da Água,
organizado pelo Conselho Mundial da Água, que será
realizado em Brasília de 18 a 23 de março. Vários
projetos desenvolvidos em municípios brasileiros serão
apresentados durante o evento.
A prefeitura
paulistana não tem dados específicos sobre ocupação
de mananciais. No entanto, a Secretaria Municipal de Habitação
contabiliza, com dados atualizados até o último
mês de outubro, 1.705 favelas na capital paulista. Dessas
comunidades, 58 estão em áreas que fazem divisa
com outros municípios, onde se concentra a maior parte
das nascentes ainda preservadas.
Os assentamentos
irregulares têm duplo impacto das fontes de água
potável, como explica o professor da Escola Politécnica
da Universidade de São Paulo José Carlos Mierzwa.
“Na medida em que você ocupa, você diminui a
capacidade de concentração de água para continuar
alimentando os mananciais. Você tem, por um lado, a redução
da recarga do manancial, a redução do volume que
chega ao manancial. Por outro, o aumento da intensidade de poluição”,
explica.
Essa situação,
especialmente em relação à contaminação
promovida pela falta de coleta e tratamento de esgoto, acaba por
inviabilizar fontes de abastecimento. Édison Carlos aponta
como exemplo desse tipo de situação a Represa Billings,
na zona sul da capital paulista, que, mesmo com uma grande capacidade
de armazenamento, não pode ser completamente utilizada
para o fornecimento de água.
“O
Sistema Billings cheio é maior do que o Cantareira. A gente
só fala do Cantareira. Por que não se fala da Billings?
Porque está no grau de contaminação tal que
não dá para considerar aquele reservatório
gigantesco”, destaca.
Áreas
irregulares e de risco
Para enfrentar
o problema, a coordenadora da Rede das Águas da Fundação
SOS Mata Atlântica, Malu Ribeiro, afirma que é preciso
analisar as situações. “Separar o que é
ocupação irregular nessas áreas de baixo
valor econômico hoje, que são áreas de manancial,
do que é área de risco”, diz Malu sobre as
situações que podem ser regularizadas e os locais
que não devem ser ocupados de forma alguma. Esses pontos
críticos, estão, de forma geral, muito próximos
aos mananciais e sujeitos a inundações.
Por isso
há a necessidade de que algumas comunidades sejam removidas,
demandando investimentos habitacionais do Poder Público.
Malu Ribeiro afirma que não se pode, quando a ocupação
está em um local crítico, assumir que como a população
está há muito tempo no local não pode ser
retirada. “Isso não é verdade. Quando é
para fazer um prolongamento de avenida, como foi a duplicação
da Faria Lima, ou uma rodovia, desapropria-se tudo que está
consolidado”, compara.
Despoluição
e recuperação das matas
Como exemplo
de processo desse tipo em que a realocação das pessoas
foi feita com sucesso, a coordenadora cita o caso dos Bairros
Cota, na região de Cubatão, próximo à
Baixada Santista. “Eram áreas consolidadas, foram
décadas dessas ocupações que estavam afetando
tanto o Parque Estadual da Serra do Mar como a disponibilidade
de água na Baixada Santista”, lembra.
A partir
de um convênio com o Banco Interamericano de Desenvolvimento
e o governo do estado de São Paulo foi investido um montante
de R$ 1 bilhão para desfazer as comunidades que estavam
instaladas havia cerca de 60 anos na Serra do Mar, desde a década
de 1950. O projeto prevê ainda o reflorestamento das áreas.
Os antigos moradores dos Bairros Cotas foram deslocados para diversos
conjuntos habitacionais construídos na região.
Como bom
exemplo, Malu cita ainda a despoluição do Rio Jundiaí,
promovida pelo consórcio das Bacias Hidrográficas
dos Rios Piracicaba, Capivari e Jundiaí (PCJ). “Foi
associada a recuperação das matas ciliares à
criação de áreas protegidas e investimento
em saneamento básico. O rio saiu, durante a crise hídrica,
da classe 4, que é o pior uso da água no Brasil,
totalmente poluído, para a classe 3. E passou a ser utilizado
como água de manancial para abastecimento público
das cidades de Indaiatuba e Salto”, detalhou sobre o processo
iniciado em 1982 para colher frutos no ano passado, quando foi
mudada a classificação do uso das águas.
Para o
professor Carlos Mierzwa, se os municípios da Grande São
Paulo agissem de forma combinada, seria possível reverter
a situação de poluição extrema de
outros mananciais. Assim, seria evitada a necessidade de a metrópole
buscar novas fontes de água em regiões cada vez
mais distantes. “Se você tivesse uma melhor infraestrutura
de coleta e tratamento de esgoto, a qualidade do Rio Tietê
ficaria melhor e essas cidades do interior e da região
metropolitana poderiam utilizar a água, inclusive São
Paulo. Isso diminuiria um pouco esse conflito pelo uso da água”.
Mais informações
sobre o Fórum Mundial da Água podem ser obtidas
no site
oficial do evento.